Uma Solução à 1ª Questão da AT 4 / PEP 2024
Comparar o atual estágio de integração da União Europeia com o vivenciado pelo Mercosul, concluindo sobre os principais desafios provenientes dos movimentos migratórios que incidem sobre os respectivos blocos de países
1. INTRODUÇÃO
A União Europeia (UE) e o MERCOSUL são dois dos principais blocos econômicos regionais surgidos no início da década de 1990 no contexto do fortalecimento da globalização.
Após a saída do Reino Unido da EU, em 2020, o bloco europeu compõe-se de 27 países, dentre os quais a Alemanha e a França, países âncoras de um processo de integração cujo marco institucional inicial foi o Tratado de Roma (1957) e que resultou na União Europeia em 1992, pelo Tratado de Maastrich. O MERCOSUL, por sua vez, apresenta como Estados membros a Argentina, o Brasil, o Paraguai e o Uruguai e todos os demais países da América do Sul como associados, exceto a Guiana e a Guiana Francesa. O bloco sul-americano constituiu-se em 1991, por meio do Tratado de Assunção.
Atualmente, a EU encontra-se em adiantado estágio de integração, buscando atingir o estágio de uma União Econômica plena. A implantação da zona do euro, em 1999, teve esse propósito. O MERCOSUL, por outro lado, ainda não atingiu o estágio de Mercado Comum, propósito de sua criação, e pode ser caracterizado como uma União Aduaneira imperfeita.
Esses dois blocos deparam-se com desafios de movimentos migratórios que incidem sobre seus países. Atualmente, o principal fluxo migratório que incide sobre a Europa origina-se de populações muçulmanas proveniente do norte da África e do Oriente Médio e, também, de refugiados da Guerra Rússia x Ucrânia, iniciada em fevereiro de 2022. O MERCOSUL, como fluxo de maior peso, depara-se com o movimento migratório de venezuelanos, que fogem do regime político e das dificuldades econômicas de seu país.
A seguir, o atual estágio de integração dos dois blocos será comparado, concluindo-se sobre os principais desafios provenientes dos movimentos migratórios que incidem sobre os respectivos blocos de países. Tal comparação será realizada por meio dos seguintes fatores de comparação: circulação de pessoas, nível econômico, qualidade de vida, ampliação e aprofundamento.
2. DESENVOLVIMENTO
a. O atual estágio de integração da UE
A facilidade de circulação de pessoas é um dos aspectos mais visíveis no atual estágio da integração da UE. O Espaço Schengen flexibilizou os controles nas fronteiras internas entre muitos países europeus, o que, aliado a boa rede de transportes do continente, estimula a entrada de imigrantes, os quais agravam as preocupações relacionadas à segurança contra o terrorismo de origem fundamentalista islâmica.
O nível da economia do bloco europeu é outro ponto de destaque na atualidade da integração europeia. A vontade política e a riqueza das economias da Alemanha e da França foram fundamentais para a adoção do que é hoje a Zona do Euro, integrada por todos os países da Europa Ocidental, exceto o Reino Unido e a Suíça. Vale notar que a China é um importante parceiro comercial da EU. Dessa forma, o excelente PIB da EU atrai imigrantes do Norte da África e do Oriente Médio, que escapam de guerras e conflitos de suas regiões.
A boa qualidade de vida é característica de relevo no bloco europeu. O atual estágio de integração do bloco permite a coordenação de muitas políticas públicas voltadas para a melhoria dos Índices de Desenvolvimento Humano, particularmente saúde, educação e transportes. (IDH). Esse é outro fator de atração migracional para a Europa, o que coloca novas demandas de seguridade social para os governos europeus.
Neste quadro de atualidade, a ampliação é um fenômeno central da política do bloco. A ampliação designa a admissão de novos membros na EU. Assim, com o propósito de fortalecer a economia e a democracia no continente, o bloco amplia suas fronteiras para abarcar países da Europa Oriental, antigos países satélites da União Soviética, o que contribuiu para a invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022. Com a Guerra Rússia x Ucrânia, as migrações para os países do bloco intensificaram-se, particularmente para a Alemanha e Polônia, o que aumenta a pressão migracional sobre o bloco.
O bom grau de aprofundamento do bloco é marca expressiva do atual estágio de institucionalização da integração europeia. Quanto maior o grau de aprofundamento, maior também será o grau de supranacionalidade presente no processo de integração. A institucionalização do bloco manifesta-se por meio de órgãos encarregados da coordenação conjunta de políticas econômicas, sociais, ambientais, política externa, cooperação policial e judiciária e, também, políticas migratórias. Com efeito, algumas medidas necessárias para conter a “islamização” da Europa não são tomadas por conta do supranacional, que muitas vezes abafa o real interesse nacional dos países.
Conclui-se, parcialmente, que, o atual estágio de integração da EU reflete-se positivamente sobre a facilidade de circulação no interior do bloco e no fortalecimento de sua economia e democracia, o que atrai fluxos migratórios para a Europa, gerando desafios relacionados à segurança, seguridade social e a questões culturais.
b. O atual estágio de integração do MERCOSUL e sua comparação com o estágio da UE
No que tange à circulação de pessoas, o bloco sul-americano trabalha para facilitar deslocamentos entre os países do grupo, sendo a eliminação da necessidade de visto no passaporte uma das medidas mais expressivas. Em comparação com a EU, o MERCOSUL não aboliu os controles fronteiriços, como no Espaço Schangen, e também não apresenta as mesmas facilidades de transporte regional como na Europa, o que torna a questão migratória menos relevante para o bloco sul-americano do que para o bloco europeu.
Quanto ao nível da economia, o MERCOSUL centra seu desempenho econômico nas economias do Brasil e da Argentina e se depara com uma forte dependência do comércio com a China, o que tem enfraquecido o projeto original de integração regional. Nesse ponto, o atual estágio de integração do bloco sul-americano assemelha-se com o da EU, pela importância econômica dos países âncoras da integração e pela participação da China nas respectivas balanças comerciais. Com efeito, o Brasil, por ser a maior economia do bloco, atrai fluxos migratórios regionais – principalmente oriundos da Venezuela, da Bolívia e do Paraguai – e internacionais, estes oriundos da África Atlântica, particularmente de Angola e Nigéria.
Em relação ao fator qualidade de vida, o atual estágio de integração do MERCOSUL em muito difere do estágio da EU. O MERCOSUL ainda não atingiu o estágio de Mercado Comum – o que iria refletir-se positivamente no grau de IDH de seus países membros, ao passo que o bloco europeu, já no nível de União Econômica, desfruta de boas posições na escala de IDH. Porém, mesmo com baixos IDH, os países do Mercosul têm recebido expressivos contingentes de venezuelanos, o que gera pressão por postos de trabalho nas cidades que recebem refugiados.
No que se refere à ampliação, o MERCOSUL, excetuando a Guiana e a Guiana Francesa, já compõe-se de todos os Estados da América do Sul, seja na qualidade de país membro ou país associado, o que difere frontalmente da EU, que possui uma vigorosa política de ampliação na direção do leste europeu, onde hoje ocorre uma guerra na Ucrânia, com crescente números de refugiados. Assim, a questão migratória é mais problemática no bloco europeu do no bloco sul-americano.
Quanto ao fator aprofundamento, a institucionalização do MERCOSUL relaciona-se à coordenação de projetos econômicos ( a IIRSA é um deles), demandas sociais e educacionais (matrículas em universidades, intercâmbio de estudantes) e de transporte ( placa de trânsito do MERCOSUL), estando muito distante da harmonização e da coordenação de políticas públicas hoje almejadas pela supranacionalidade EU, mas adequadas para coordenar o combate ao crime organizado que pode acompanhar correntes migratórias ilegais.
Conclui-se, parcialmente, que o atual estágio de integração do MERCOSUL é menor do que o da UE, o que torna a questão migratória mais proeminente no bloco europeu, devido à sua maior integração política e econômica; essa situação impõe maiores desafios migratórios ao bloco europeu do que ao bloco sul-americano.
3. CONCLUSÃO
O atual estágio de integração da UE e do Mercosul apresenta diferenças significativas no que diz respeito à circulação de pessoas, economia, qualidade de vida, ampliação e aprofundamento.
Em síntese, a comparação realizada revelou que enquanto a EU desfruta de maior integração política e econômica, refletindo-se em desafios migratórios mais densos, o MERCOSUL, por sua, vez, depara-se com uma integração menos avançada, o que torna a questão migratória menos relevante no bloco sul-americano. Essa diferença implica em desafios distintos no enfrentamento dos efeitos não desejados dos movimentos migratórios.
No que diz respeito à EU, a proteção da segurança de suas fronteiras internas contra a entrada de imigrantes ilegais é um desafio de difícil superação em face das pressões migratórias externas e das políticas de livre circulação de pessoas adotas por alguns países do bloco. Essa questão avulta de importância em face do terrorismo internacional e da crescente presença de muçulmanos no território europeu. No Mercosul, esse problema é de menor monta, pois seus países tem liberdade de adotar política migratórias independes e a pressão migratória externa não é da mesma natureza do que na Europa. Na América do Sul, o desafio maior na questão de segurança migratória prende-se à integração de políticas de combate ao crime organizado, particularmente aos crimes relacionados ao tráfico de pessoas.
Ainda para a Europa, superar a crescente xenofobia radical contra imigrantes emerge como um outro desafio ao bloco, uma vez que o quadro de transição demográfica da Europa indica a necessidade das migrações para manter o dinamismo da economia do bloco de Maastrich, o que não ocorre no bloco sul-americano, seja pela ausência de xenofobia cultural contra os imigrantes seja pela posição ainda confortável da transição demográfica da América do Sul.
Desafio comum aos dois blocos reside na inclusão em postos de trabalho e na seguridade social de imigrantes. Embora esse desafio seja maior na Europa, o bloco sul-americano depara-se com a corrente migratória oriunda da Venezuela, o que obriga governos locais a estabelecer ações estratégicas para receber refugiados da crise venezuelana, das quais a Operação Acolhida realizada pelo Brasil é um exemplo.
Por fim, a comparação realizada mostrou que os diferentes graus de integração ora vivenciados pelos blocos europeu e sul-americano refletem-se nas suas questões migratórias: enquanto a EU enfrenta desafios de maior peso, o MERCOSUL, devido à sua integração bem menos avançada,. encara desafios menos pronunciados.
Bom estudo!
(Solução de Paulo Roberto Laraburu -Cel R1 – M Sc RI (UnB))